Se
o facebook não é o equivalente a Ágora grega, reunindo os espíritos
ansiosos por debates filosóficos e existenciais, pelo menos cumpre um pouco
desse papel em nossa época. Tópicos que começam como debates informais, puro
lazer de internautas, as vezes tomam proporções complexas, e podem até mesmo
esboçar teorias que carregam algo de relevante.
Numa
dessas discussões que, mesmo virtuais, flertam com algo do real, o amigo Renan
Figueiredo lançou uma curiosa teoria sobre a estética da literatura recifense e
mineira: Para ele, a marca registrada de grandes escritores do Recife seria o
vasto uso de adjetivos, enquanto que literatos de Minas Gerais se
caracterizariam por abundantes vírgulas ao longo de seus textos.
Entrei
no espírito da teoria, lançando duas hipóteses pelas quais o escritor mineiro
apresentaria essa fascinação com o recurso da vírgula nos seus manuscritos:
1)
Fôlego: os mineiros estão acostumados; e os turistas sempre se espantam.
Qualquer pessoa com instinto peripatético que
resolva fazer um passeio a pé pelas ruas das cidades de Minas, irão se deparar
com morros, morros, e morros. Não há preparo físico que resista a uns suspiros.
Qualquer narrativa empreendida num desses passeios pelas colinas e montanhas da
região será igualmente comprometida (assim como a qualidade do gado daqui, que
tem mais osso e menos gordura pelo mesmo motivo). Minha teoria numero 1 sobre
as vírgulas é que são uma representação narrativa da falta de fôlego, como um
causo qualquer que se conta à alguém enquanto passeia pela cidade.
2)
Noia: Mineiro não é só desconfiado dos outros, mas também tem medo da
desconfiança alheia. Caso típico de projeção, desses complexos dos quais Freud
já tratou há quase um século. Secular é também a fama de "bom moço"
que os mineiros tem, sabe-se lá porque. Os livros
de história tem versões contraditórias para os mesmos fatos, os discursos
destoam da prática. O mineiro parece propenso a se justificar, mesmo quando não
fez nada de errado. A vírgula, nessa minha teoria número 2, é uma representação
das brechas dentro do discurso, onde o mineiro insere suas frases feitas que
tem, como unico intuito, vender um peixe muito mais generoso que o pescador.
Por
fim, pedi perdão pela prolixidade nos comentários, algo que vai na contramão do
que alguém chamaria "boas maneiras" nos foruns da internet (leia-se
"favor não transformar o aspecto descontraído da rede em longas
teorizações, metafísicas transcendentes, e afins"). Entretanto, me
perguntei se essa não seria outra característica literária do mineiro, além das
vírgulas: compensar na escrita o silêncio desconfiado do cotidiano.
Para
quem se interessar, veja aqui a discussão na íntegra do fórum original:
Um comentário:
hahah
ótimas observações
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