domingo, 23 de novembro de 2014

Novo Site

Pois é, agora tenho um site oficial, que fiz em parceria com a empresa Belo Site. O link é esse abaixo:

Todo o conteúdo desse blog foi direcionado para lá. O que me daria margem para alguma frase de efeito tipo "lá, além do meu futuro, está também o meu passado", ou qualquer outra coisa que deslegitimasse esse blog antigo. Mas a verdade é que esse blog aqui sempre foi bem legal de administrar, sempre me dei bem com essa interface. E, no fim das contas, o trabalho lá e aqui será o mesmo. Só muda o endereço.

Nos vemos no novo link, amigos. Um abraço!
Rafael

domingo, 24 de agosto de 2014

Agamben e a Inoperosidade

[Como o acaso produz insights]

Deixei para ler hoje um texto que já tinha salvo em meu computador há alguns dias. É uma entrevista com o filósofo italiano Giorgio Agamben. Cada trecho das suas respostas tem um valor especial, de maneira tal que me parece impraticável destacar isso ou aquilo .

Só que, ao executar a tarefa cotidiana de "me perder" na timeline do face, me deparei com um link que produziu um diálogo imediato com uma das respostas que eu lera há pouco na entrevista. Trata-se de uma arquiteta grega que manipula objetos de uso doméstico, como regadores, garfos, pratos, etc, deturpando seus usos mas mantendo suas características. O caráter de utilidade do objeto é esvaziado, fazendo dele uma peça de arte. Porque, afinal, a arte não é nada mais que descobrir as potencialidades da inutilidade; ver beleza em tudo aquilo que não envolve atividades de sobrevivência ou reprodução. Arte é dançar com vazios, brincar com lacunas e abismos.

domingo, 27 de julho de 2014

O Réu e o Rei

Estou próximo de concluir a leitura de O Réu e o Rei, livro de Paulo César de Araújo publicado esse ano, mas já adianto: é completamente indispensável para fãs e sobretudo estudiosos da nossa música popular brasileira. Simplesmente não consigo parar de lê-lo.

Em suas mais de 500 páginas, o jornalista e professor aborda os bastidores de sua luta judicial com Roberto Carlos, sobre a famigerada biografia não-autorizada do cantor, publicada pela editora Planeta em 2007. O super bem escrito relato faz emergir personagens apresentados sem maniqueísmos, em toda a sua complexidade, episódios surreais típicos do pior aspecto da sociedade brasileira, e uma surpresa que me fez gargalhar em alto e bom som enquanto lia.

A trajetória é contada de maneira cronológica, e inevitavelmente Paulo César se coloca como personagem da trama. Ao iniciar a leitura, acreditei que os trechos de sua infância seriam aborrecidos de se ler, baseado em algumas biografias onde se anseia logo pela chegada dos episódios mais conhecidos. Mas logo percebi que o jornalista não só é meticuloso com os dados de suas pesquisas, mas também tem uma forma de escrita arrebatadora. Aviso: só comece a ler o livro se tiver tempo livre, porque não dá pra parar (esse fim de semana chuvoso tem me ajudado na tarefa).

Não vou ficar falando dos detalhes tão pequenos dessa obra, mas já me adianto para um trecho que é sintomático de um traço lamentável do caráter nacional e da falência de nossas instituições na contemporaneidade. É logo após a audiência de conciliação em que Roberto Carlos consegue a proibição da sua biografia (que até então almejara elogios quase unânimes de fãs, artistas e jornalistas Brasil afora). O juiz, que se revelara tendencioso a favor de Roberto por toda a audiência, espera a definição da sentença para declarar que é músico, enquanto entrega um CD seu ao Rei e pede para tirar fotos com ele. Ali, está representado o fisiologismo com que alguns membros de nossas instituições comprometem todo um aparato que, em tese, deveria ser imparcial e estar a serviço da justiça e dos interesses públicos.

Mas a grande surpresa desse livro é... João Gilberto! Todos os trechos que falam de João são simplesmente fantásticos, inacreditáveis, mágicos até! Me fizeram rir e me emocionar. Eu gastaria mais uns três textos desses para descrever! Me limito a mencionar apenas um deles, quando Paulo César presencia o criador da bossa nova relatar a diferença entre o sapateado de diferentes tradições de dança, e não só explicar teoricamente esse dado, mas exibir na prática e com uma imprevisível elegância, que João domina muito mais do que a arte do canto e do violão.

domingo, 20 de julho de 2014

Já perdi a conta de quantos emails recebi com textos de autorias completamente duvidosas, pastiches que teriam sido supostamente assinados por escritores, poetas e cronistas diversos. As piadas (mesmo aquelas com rudeza de botequim) atribuídas ao Veríssimo; os poemas de sentimentalismo a flor da pele seriam de Clarice ou Caio Fernando Abreu; as crônicas mais contundentes por Arnaldo Jabor, e por aí vai.

Mas não me recordo de ter recebido nenhum desses arremedos literários com a assinatura de Rubem Alves. Fico aqui especulando os motivos. Diferente de autores como Paulo Coelho, Alves era muito bem sucedido ao aliar elegância e simplicidade. Suas frases parecem as pinceladas de pintores experientes, que só depois de uma longa caminhada da alma e da técnica alcançam um traço de encantadora espontaneidade.

Enfim, não vejo como negativo essa história de uma obra literária apresentar ganchos e repetições que facilitem imitadores. Cada estilo é um mundo a parte, e funciona a seu modo. Veríssimo é inimitável, apesar de seu texto jocoso e (falsamente) acessível incitar os falsários a tentar. Rubem Alves talvez tenha sido poupado das clonagens devido à sua sobriedade e sua lucidez, aliadas também ao horizonte de leveza e beleza que mirava sempre.

O educador e filósofo é daquela qualidade de pensador que conseguiu ser acessível sem apelar a estereótipos. Tanto em sua postura de homem público quanto na essência de seus livros e declarações, a porção vaidosa de sua humanidade ficou em segundo plano, privilegiando sua mensagem de validade inexpirável. Rubem Alves flertou com a eternidade ainda em vida, e tornou-se universal para sempre.

segunda-feira, 26 de maio de 2014


Mais do que as experiências passageiras, como colônias de férias ou paqueras de verão, esses anos todos de vida universitária tiveram uma profunda influência na minha visão de mundo. Comecei a prestar mais atenção em alguns detalhes do cotidiano que eu ignorava, e, além de notar, tentar estabelecer conexões entre eles e uns tantos outros assuntos e ideias. Surgiu aí também uma chatice, de querer tornar complexo até mesmo fenômenos que nem sempre o são – efeitos colaterais de se pensar demais.

Passei a ter uma relação mais séria também com o que acontece fora das salas de aula. Um compromisso com as coisas boas da vida, e o desejo de cumprir as tarefas de maneira satisfatória, de ser presente quando é necessário.

Talvez eu tenha pago um preço por isso, na perda da espontaneidade de outrora, substituída por uma autoconsciência e uma definição do que me cabe ou não fazer. Lembro de Paul McCartney dizer, em uma entrevista, da diferença do Elvis Presley antes e depois do exército. Ao retornar a carreira, "the pelvis" parecia mais ensaiado, havia em seu olhar algo de hesitação, além da composição de um personagem que pudesse figurar bem nas fotos. Nada diferente das caretas e gestos exagerados do próprio Paul, hoje em dia – o que, dada a beleza da versão madura de McCartney, mostra que o processo não é tão negativo quanto parece.

Acho que, em certa medida, a vida adulta necessita de máscaras; mas se é para vestí-las, que sejam verdadeiras, que possam exprimir alguma verdade sobre nós mesmos. E, na verdade, a perda da espontaneidade de antes seria, não uma perda, mas apenas um eixo que precisa ser apertado novamente. O que é a vida senão um palhaço de quermesse, que equilibra os pratos girando sobre varetas, sorrindo? 

terça-feira, 20 de maio de 2014

Cyro dos Anjos profetiza a Bossa Nova


Cyro dos Anjos
Li apenas dois livros de Cyro dos Anjos, mas isso bastou para que o considerasse meu escritor brasileiro preferido (até porque li mais da metade da sua obra ficcional, restando apenas o romance derradeiro Montanha). Sua narrativa é introspectiva, com tons de crônica, polvilhada com dados comentados sobre vários episódios e figuras da cultura ocidental, tudo isso costurado por uma escrita refinada e também clara.

Amanuense Belmiro é sua obra prima, mas Abdias tem inúmeros méritos. E um dos que mais me impressionaram (apesar de ser bem sutil, a princípio) foi o fato de Cyro, através de seu alter-ego Abdias, fazer uma verdadeira profecia sobre o surgimento da bossa nova, movimento musical que acabou por batizar e se compor como um gênero à parte.

sábado, 17 de maio de 2014

Outro dia, estava eu a andar de bicicleta, quando leio a placa numa casinha simples: "vende-se chup-chup. 50 centavos com suco, 80 centavos com leite".

Bateu uma nostalgia danada da infância e pré-adolescência, quando eu e meus amigos comprávamos chup-chup nas casas da vizinhança, as vezes chamando até mesmo de madrugada, fizesse frio ou calor. Tinha de morango, chocolate, coco, meu preferido era um rosa de creme holandês, cujos ingredientes ainda hoje me são desconhecidos, mas o sabor permanece memorável.

Parei como um menino em frente a casa. Enquanto contava as moedas animado, me peguei pensando "mas, peraí, com que água eles fazem o chup-chup? É feito com suco de pózinho, esses vagabundinhos de marca genérica? Polpa de fruta é que não é! E chup-chup de leite? Mas eu não tenho tomado leite! E se eu passar mal?"

"Ah, Rafael, você está ficando velho", constatei enquanto voltava a pedalar.

segunda-feira, 14 de abril de 2014

A Arte como Caminho Espiritual - um breve ensaio


Sou um grande admirador do filósofo britânico Paul Brunton. Certa vez, li um aforisma dele que nunca mais esqueci, e transcrevo aqui de memória (acrescentando apontamentos meus).

Dizia ele que a religião é dispensável para o verdadeiro artista. Não que esse artista não possa ter uma; mas é que a arte pode servir como um caminho espiritual tão válido quanto a religião.

Se for um artista empenhado em executar uma obra cada vez mais próxima daquilo que sua alma sopra pra si mesmo (e não um embusteiro em busca de dinheiro fácil), então passos serão dados em direção a uma espécie de redenção.

Essa ideia soa meio messiânica, mas dois tipos de pessoas irão compreendê-la: os artistas - ateus ou não -, que algum dia produziram algo que lhes pareceu profundamente sincero; e as pessoas que, em dado momento, sentiram uma identificação de alma com uma obra artística.

E esse é o ponto que acho interessante em relação a caminhada espiritual da arte: as obras funcionam como faróis, como vislumbres de algo maior, algo que pode-se chamar de Deus, de paraíso, ou algo inominável. A verdadeira obra de arte pode inspirar todo tipo de pessoa (quem faz e quem aprecia) a se abrir para uma transformação interna.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

"Venha, meu amor": a história da canção celta "Siúil a Rún"



Uma canção chamada Shule Aroon e outra chamada Johnny has Gone for a Soldier. Uma simples audição revela diversas coincidências entre ambas. Na verdade, apesar dos títulos e das melodias levemente diferentes, todas elas derivam da mesma canção, chamada Siúil a Rún, um antigo tema tradicional da Irlanda, de autoria desconhecida.


sábado, 30 de novembro de 2013

Deus, essa epiderme


Para os crentes, a oração é a construção de uma linha direta com Deus, enquanto que, para os ateus, é um tempo perdido e nada divertido. E no meio dessas perspectivas, existem outras, como os que oram por medo do inferno ou motivados por desejos (as famosas "orações pedintes"), mas não é nessas searas que quero me meter.

Esses dias, fiquei pensando no quanto de química existe na oração. Afinal, tudo que fazemos ativa e desativa substâncias corpo afora; desde uma olhada tímida para a lua até o ato de correr na maratona de são silvestre. Essas coisas objetivas que fazemos inevitavelmente despertam químicas, talvez desconhecidas por nós, que percorrem as tantas rotas do nosso pequeno grande organismo.


sábado, 7 de setembro de 2013

Download da HQ Ana Crônica


Em 2009, editei a HQ, Ana Crônica, que lancei pela TGB Gráfica e Editora. Foi meu primeiro trabalho mais elaborado. A primeira (e única) tiragem se esgotou, e agora, comemorando 4 anos de seu lançamento, enfim a disponibilizo na internet.

Ana Crônica é uma personagem deslocada num mundo que considera maluco demais para sua cabeça. Mora numa quitinete em São João Del Rei, está um pouco acima do peso, e adora filmes e músicas antigas. É amiga de muita gente da universidade, detesta seu emprego, e tenta levar a vida com um pouco de autenticidade e alegria.

Dividi as duas histórias que compõem a HQ em arquivos separados. Abaixo o link das duas. E, em seguida, o download do programa Comic Display, que possibilita a leitura das histórias no formato cbr.

Pros que não leram, espero que gostem. Quem já tem o gibi impresso, fica uma outra forma de reler e de guardar.

Rafael Senra

quarta-feira, 31 de julho de 2013

Sobre Afetos e Jardins


Foto: Paloma Parentoni
 1 - Homens e Mulheres (e não "ou", "versus", "com", e eteceteras)

Existem tantas maneiras de se estar no mundo quantas forem as pessoas à habitá-lo. E nossa diferença não vem apenas da cor dos olhos ou das impressões digitais. Não vem de humanas miudezas. Acima das heranças, são nossas escolhas que mais dizem sobre nós. Todo aquele que anda escreve a sua história com pegadas.